Valdir Aguilera
 Físico e pesquisador

 

 
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Mistérios da matéria - os quarks

Valdir Aguilera

Sabemos que no Universo existem apenas Força e Matéria. Esta sofre constante atuação daquela num processo interminável de transformação e organização.

A matéria que compõe os corpos que a Física e a Química estudam é organizada em porções que os gregos chamaram de átomos, isto é, indivisível. Hoje sabemos que os átomos não são indivisíveis, mas que têm uma estrutura interna.

Nos primeiros anos após a descoberta da divisibilidade do átomo, pensou-se que eles eram formados por duas partículas, os elétrons (com carga elétrica negativa) e os prótons (com a mesma carga elétrica do elétron, mas positiva). Os prótons se localizavam no centro do átomo em torno do qual os elétrons orbitavam. Poucos anos depois, descobriu-se que o núcleo atômico continha mais um inquilino, o nêutron, muito parecido com o próton mas sem carga elétrica. Os interessados em mais detalhes sobre as diversas propostas de modelos para representar os átomos pode consultar o artigo Conceitos de Física Moderna - 2: A saga do átomo, disponível na seção "Artigos" deste site.

Em 1964 Murray Gell-Mann, inspirado na Teoria de Representação de Grupos Unitários, sugeriu a existência de partículas que ele batizou de quarks e que seriam, juntamente com os elétronsos constituintes fundamentais da matéria. Embora os quarks ainda não tenham sido observados diretamente, não mais se duvida de sua realidade. Eles são "vistos" após colisões provocadas no interior de poderosos aceleradores de partículas construídos nos E. U. A. e na Europa. Na biblioteca deste site há um vídeo sobre os quarks e onde se vê o acelerador do Fermi Lab (interior e exterior), localizado em Illinois. As explicações estão em inglês, mas as imagens são bastante informativas.

O próton e o nêutron são formados por dois quarks de tipos diferentes. Um deles recebe o nome de quark down e ou outro, quark up. A figura 1 mostra a estrutura interna de um próton e de um nêutron. O próton é constituído de dois quarks up e um quark down;  o nêutron é formado por um quark up e dois quarks down. [Não dê importância às cores dos quarks.]


Figura 1.  Estrutura interna do próton e do nêutron.
d representa um quark down e u um quark up

De acordo com este modelo, toda matéria que forma os corpos do universo é formada por quarks e elétrons. Os prótons e nêutrons deixaram de ser os tijolinhos fundamentais dos núcleos atômicos, cedendo lugar para os quarks. Em resumo, os átomos são formados por elétrons, prótons e nêutrons. Estes últimos, por sua vez, são formados por quarks, up e down. Os elétrons não têm estrutura interna.

Mas, a história não termina aqui. Há algumas surpresas pela frente.

Descobriu-se que em vez de dois, há seis tipos de quarks! Somam-se aos down e up mais quatro tipos de quarks:  estranho, charmoso, bottom e top. Esses quarks, que não são estáveis como os up e down, não fazem parte da matéria ordinária que detectamos com nossos sentidos e instrumentos. Poderíamos perguntar, então,  o que eles estão fazendo no universo, para que servem?

De acordo com uma teoria da Física Moderna, chamada de modelo padrão, os quarks são os tijolinhos que formam uma quantidade enorme de partículas, denominadas genericamente de hádrons, e que se mantêm coesas graças a forças ou interações fortes atuando entre os quarks. A maior parte dessas partículas tem existência efêmera, com vidas extremamente curtas. Aparentemente não têm serventia alguma. Então, por que existem?

As doze partículas fundamentais

De acordo com o modelo padrão (que, além da classificação das partículas elementares  inclui, também, a classificação das  forças fundamentais) as 12 partículas básicas da natureza se agrupam em três famílias. Dessa dúzia de partículas, 6 são quarks e 6 são léptons (o elétron é um dos léptons). A tabela 1 mostra como as partículas fundamentais se agrupam nessas famílias. Os números entre parênteses são as massas correspondentes em múltiplos da massa do próton, isto é, para se saber a massa de uma delas multiplica-se o número entre parênteses pela massa do próton.

    Primeira família

•  elétron (0,00054)
•  neutrino do elétron (<10-8)
•  quark up (0,0047)
•  quark down (0,0074)
        Segunda família

•  muon (0,11)
•  neutrino do muon (<0,0003)
•  quark charmoso (1,6)
•  quark estranho (0,16)
        Terceira família

•  tau (1,9)
•  neutrino do tau (<0,033)
•  quark top (189)
•  quark bottom (5,2)

Tabela 1. As três famílias em que se agrupam os quarks e os léptons.

Os membros dessas famílias são os constituintes mais fundamentais de tudo o que existe na natureza e daquilo que é produzido artificialmente nos grandes aceleradores de partículas. Por que são 12 e não 15, 20 ou 80? Por que se agrupam em três famílias e não em uma só, ou em quatro ou mais?

Os mistérios não terminam aqui. A cada uma das partículas fundamentais mencionadas há uma anti-partícula associada. A tabela 2 mostra as 12 anti-partículas em suas famílias (ou deveríamos chamar de anti-famílias?). O pósitron da tabela 2 corresponde ao elétron da tabela 1 e assim por diante.

        Primeira família

•  pósitron
•  anti-neutrino do elétron
•  anti-quark up
•  anti-quark down
        Segunda família

•  muon positivo
•  anti-neutrino do muon
•  anti-quark charmoso
•  anti-quark estranho
        Terceira família

•  tau positivo
•  anti-neutrino do tau
•  anti-quark top
•  anti-quark bottom

      Tabela 2. As três famílias em que se agrupam os anti-quarks e os anti-léptons.

Chegamos aos ingredientes mais íntimos da matéria?

Na busca dos elementos mais básicos da matéria, o pensamento humano começou com a proposta dos átomos. Assim raciocinavam os antigos filósofos e cientistas: um corpo qualquer, uma barra de ferro por exemplo, pode ser dividida ao meio para obtermos duas barras de ferro menores. Cada uma dessas novas barras ainda pode ser dividida várias vezes para se obter barras cada vez menores. Mas, chegará o momento em que não será mais possível dividir a barra. Ela terá atingido a condição de indivisibilidade e esse elemento indivisível foi batizado de átomo. Os átomos passaram a ser considerados as elementos básicos na formação dos corpos.

Mais tarde, na verdade muitos séculos depois, descobriu-se que o átomo era formado de partes menores, tinha uma estrutura. Passaram os cientistas a descrever o átomo como uma estrutura composta de elétrons circundando um núcleo central. Não foi necessário muito tempo para se descobrir que o núcleo tinha partes internas: os prótons e os nêutrons. Pensava-se que estes, juntamente com os elétrons, eram os menores constituintes da matéria. Não são.

Hoje sabemos que mesmo os prótons e nêutrons têm uma estrutura interna. São formados por quarks, como descrito acima. Os elétrons (leia-se, os léptons), por sua parte, ainda são considerados como partículas elementares, indivisíveis.

Contudo, este parece não ser ainda o fim do filme. Há uma teoria (Teoria das Cordas), que vem sendo bastante discutida pelos físicos. Ela propõe os quarks e os léptons também são resultados de vibrações específicas de cordas infinitesimais. Essas cordas passariam, assim, a ser os elementos mais básicos da matéria. A Teoria das Cordas considera, também, as forças fundamentais do Universo. Não vamos nos ocupar, agora, desse detalhe da teoria, embora importante.

A proposta das cordas vibrantes é bem recebida pelo autor deste artigo. Ela vem corroborar o que o Racionalismo Cristão vem afirmando desde o início do século passado e que podemos resumir nestas palavras "a toda partícula de matéria há uma força associada que a faz vibrar com frequência característica".

A Teoria das Cordas enfrenta alguns problemas ainda sem solução e apresenta alguns aspectos que causam algum desconforto. Conforme sua formulação, ela requer que, além das três dimensões espaciais que nos são familiares, ainda haja mais sete ou oito que ainda não foram detectadas (e possivelmente nunca sejam, pois são extremamente pequenas). Além disso, seu desenvolvimento matemático baseia-se em espaços, ou formas, de Calabi-Yau, estruturas algébricas ainda objeto de estudo dos matemáticos. Quando os quarks foram propostos, a Teoria da Representação de Grupos Unitários em que Gell-Mann se baseou era bastante conhecida e bem estabelecida. Foi relativamente fácil trabalhar com seus conceitos. O mesmo não acontece atualmente com as bases matemáticas da Teoria das Cordas. Faz-se necessário desenvolver essas bases com suficiente profundidade e clareza. Felizmente, há muita gente trabalhando nisso.


 

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